Radio Planeta Rei

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

João Paulo critica presidente do STF e afirma que pensou em se matar

O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) concede entrevista aos jornalistas Fernando Rodrigues e Mônica Bergamo
Deputado Federal João Paulo Cunha do PT
Em alguns momentos quando ficou claro que seria condenado no julgamento do mensalão, o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) pensou em cometer suicídio. "Todo mundo pensa como saída a morte", diz ele.

"Chorei muitas vezes", relata o petista, que diz não considerar justa a pena que recebeu de 9 anos e 4 meses de prisão. Pretende recorrer até quando possível para não ir preso e manter o mandato na Câmara. Não renunciará.

João Paulo concedeu entrevista ao "Poder e Política", projeto da Folha e do UOL, nesta terça-feira (11) em sua casa, em Osasco, na Grande São Paulo. Foi sua primeira entrevista formal depois de ter sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal. Apesar do momento de angústia, o petista de 54 anos não demonstra desânimo agora.

Diz estar confiante sobre alguma redução da pena na fase dos recursos do processo -algo improvável. Fez duras críticas ao STF. Uma delas, contra Joaquim Barbosa, presidente da Corte:
"O ministro Joaquim Barbosa, no meu caso, não é que ele não teve prova. Eu produzi prova que me absolvia. E ele foi contra as provas. A ponto de, nos últimos dias, não só ter ido contra as provas, como tem sido irresponsável. De ter dito coisas, que não estão nos autos, da sua boca. O juiz não pode dizer quando não tem prova".

Informado da declaração de Cunha, Joaquim Barbosa preferiu não se manifestar.

Meticuloso, João Paulo diz ter cronometrado os minutos que reportagens da TV Globo dedicaram ao caso do mensalão. Pelas suas contas, em agosto, foram cinco horas. "Só no meu caso, uma hora e 15 minutos. Não há juiz que resista à uma pressão dessa."

A mídia, segundo o ex-presidente da Câmara no biênio 2003-04, não se contentaria em ver alguns petistas condenados. "Querem é que o PT sangre mais. O que eles querem é chegar na liderança máxima do PT, que é o Lula".

João Paulo também foi multado em R$ 370 mil. Seu patrimônio declarado à Justiça Eleitoral é de R$ 376 mil. Vive na mesma casa, em Osasco, há 21 anos. No momento, está lendo o romance "Barba ensopada de sangue", de Daniel Galera. A seguir, trechos da entrevista:

Mandato cassado

É bom a gente aguardar a sentença do Supremo para depois ver qual vai ser a posição da Câmara dos Deputados. É necessário aguardar o transitado em julgado. Fui eleito o deputado federal mais votado do PT de SP. Tive mais de 255 mil votos. Tenho cumprido com rigor o meu mandato.

Condenado com mandato

O [resultado do] julgamento significa do presente para o futuro. O voto obtido na última eleição foi na vida pretérita. Eu tenho 30 anos de mandato. Eu não tenho nenhum processo na minha vida. Não tenho um inquérito. Nunca fui acusado de nada. As minhas mãos são absolutamente limpas. Por que teria qualquer receio em representar o povo que me aceitou, que votou em mim? Eu tenho esperança de resolver porque é inaceitável, é inacreditável. É uma coisa quase surreal ser condenado de forma injusta. Eu afirmo isso. De forma injusta. É uma dor muito grande. É claro que eu vou cumprir a sentença. Não tenho receio disso. Mas vou lutar até as últimas consequências para provar que eu sou inocente e que é uma injustiça o que estão fazendo.

Sacco, Vanzetti e Dreyfus

Com base na lei fria você pode ser condenado. Agora, não significa que é justa a condenação. A história já conviveu com julgamentos e que depois se comprovaram erros judiciais. Nós tivemos no Brasil na década de 30 os irmãos Naves, que foram condenados à base de tortura, admitiram crimes. Nos EUA, Sacco e Vanzetti. Na França, o caso Dreyfus. Temos vários precedentes na história de erros judiciais.

TV Globo

É inaceitável da forma que foi feito. Não tem como o Judiciário julgar de forma isenta. Somente o Sistema Globo de Televisão, foram cinco horas de cobertura em agosto. Somadas as reportagens. TV Globo, aberta e fechada. Cinco horas. Só no meu caso, uma hora e 15 minutos. Não há juiz que resista a uma pressão dessa. Essa sociedade de espetáculo leva essas pessoas a ficarem com receio. Eu já estou condenado. Eu sofro há sete anos. Veja a crueldade do espetáculo. Não basta condenar. Não basta mandar ao ostracismo e ao limbo o sujeito. É quase uma pena de morte. Esse tipo de julgamento não é um julgamento isento.

Renúncia ao mandato

Eu já tive outras oportunidades de renunciar, todo mundo disse que eu ia renunciar. Não renunciei. Enfrentei as urnas. Fui o mais votado do PT de SP em 2006. Não vou renunciar porque eu não tenho culpa. E vou insistir até o final com essa mesma segurança que eu tenho de que eu não errei.

Preparação para a prisão

Não trabalho com essa hipótese. Vou lutar até o final. Primeiro, para provar inocência. Segundo, para não ser preso. A prisão é feita para quem merece. Eu não mereço. Eu tenho recursos ainda. Eu tenho embargo infringente, tenho embargos declaratórios.

Joaquim irresponsável

O ministro Joaquim Barbosa, no meu caso, não é que ele não teve prova. Eu produzi prova que me absolvia. E ele foi contra as provas. A ponto de, nos últimos dias, não só ter ido contra as provas, como tem sido irresponsável. De ter dito coisas, que não estão nos autos, da sua boca. O juiz não pode dizer quando não tem prova. Ele disse: 'Na residência oficial se negociava propina'. Onde está escrito? Qual o documento que embasa a fala do ministro Joaquim Barbosa?

[E a reunião com Marcos Valério na residência oficial da Presidência da Câmara?] Isso é o contrário. Ao invés de agravar, atenua. Porque, se fosse para falar de propina, eu pediria para ele me levar pessoalmente. Não precisaria depois eu mandar minha mulher ao banco e entregar o documento, tirar xerox, assinar.

Pegar esse dinheiro...
Saque de dinheiro

Na época, no calor da disputa, na circunstância da situação, você pede para a pessoa [tesoureiro do PT], que fala assim: 'Você pode buscar lá?' Eu vou recusar? Fui lá e peguei.

Querem chegar ao Lula

O PT já admitiu o crime do caixa dois. O problema é que parte da sociedade, parte da oposição e grande parte da mídia não admitem que o PT tenha assumido somente o crime de caixa dois. É insuficiente para parte da mídia e das elites brasileiras. O que eles querem é que o PT sangre mais. O que eles querem é chegar na liderança máxima do PT, que é o Lula.

O PT errou

O PT não decidiu partir para o crime. O que o PT fez foi entrar na prática tradicional dos partidos brasileiros. Então, foi um erro? Foi um erro.

Página virada

Para o PT, o mensalão é página virada. O PT tem que entrar no passo seguinte. Se reinventar. Descobrir e apresentar à sociedade novas bandeiras, novos sonhos e programas. Tem que dar um passo adiante. Deixar para trás o mensalão. O mensalão é problema de quem está no processo. Ponto. O PT é olhar para a frente, caminhar para a frente.

PT acuado

Teve um comportamento político nesse julgamento [do mensalão]. Diante disso, o PT fica acuado. O PT poderia puxar a sociedade. Mas aí fica um paradoxo. Se ele vai muito na frente, a sociedade fica muito atrás, ele perde a sociedade. Então ele tem que dar uma recuada. Uma parte dos meios de comunicação impede o Brasil de avançar.

Valério acusa Lula

Eu desconheço o que foi falado [que o mensalão financiou despesas pessoais de Lula]. Tomei conhecimento olhando o jornal. Prefiro não comentar. Pela demanda do presidente no primeiro mandato, é muito difícil que ele soubesse ou acompanhasse qualquer tratativa dessa natureza [empréstimos do mensalão]. Eu acho que o presidente não tinha qualquer conhecimento e não era obrigação dele acompanhar o desempenho do PT.

Suicídio e choro

Chorei muitas vezes. Muitas vezes mesmo. Porque quando você fica sozinho, você começa a perguntar 'por quê?'. Você extravasa de que jeito? Todo mundo pensa como saída a morte. Porque você vai fazer o quê? Passou pela minha cabeça, claro. Vendo as várias experiências no mundo, lendo um pouco como a gente lê. Sabendo o que acontece. Claro que você pensa em tudo.

FERNANDO RODRIGUES
DE SÃO PAULO
MÔNICA BERGAMO
COLUNISTA DA FOLHA

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